“Wilhelmus van Nassauve, ben ik van Duitsen bloed...” Assim começa o hino nacional holandês, intitulado “Het Wilhelmus”. Há 7 meses atrás, mais ou menos, quando nem os grupos da Copa do Mundo haviam sido sorteados, uma brasileira chamada Talita, ao ser perguntada sobre quem seria campeão mundial, respondeu prontamente: “HOLANDA!”. Muito falava-se no Brasil, na Itália, na Alemanha, na Espanha, que havia sido campeã européia em 2008, mas ninguém falava em Holanda. Afinal, de onde Talita havia tirado Holanda? E logo depois de ter dado esta surpreendente resposta, Talita se fez a mesma pergunta: “De onde tirei Holanda?”
Fizemos uma aposta sobre quem seria o campeão, e eu falei que a Inglaterra tinha mais chances. A aposta, venceria quem chegasse mais longe das duas seleções. Para a Talita, torcer pela Holanda era fácil, já que ela não gosta da Seleção Brasileira. Segundo ela, “é uma seleção cheia das maracutaias e escalada por interesse de empresários, e não realmente quem está bem.” Assim sempre foi Talita, decidida a torcer contra a Seleção Brasileira, claro, pela decepção de haver sempre essas suspeitas. Quando ela me perguntou porque ela deveria acreditar na Holanda, dei-lhe diversos argumentos. Assim que terminei, a postura dela mudou e ela realmente passou a acreditar que a Holanda era capaz de levantar a taça da Copa do Mundo de 2010.
Conforme o tempo foi passando, Talita foi acreditando ainda mais na seleção holandesa. Muito também, porque os talentos individuais da Laranja Mecânica estavam indo muito bem em seus clubes. Wesley Sneijder, na Inter de Milão e Arjen Robben, no Bayern de Munique. Tanto é que ambos fizeram a final da Liga dos Campeões da Europa, vencida pela Inter de Milão. Aquilo tudo foi criando dentro de Talita uma esperança incrível. Só que ao mesmo tempo, no coração de Talita foi surgindo um sentimento estranho. Ela, quando menos percebeu, estava amando a Holanda, estava acompanhando todos os passos da seleção holandesa e se viu como uma perfeita e absoluta holandesa. Ela adotou, de vez, a Holanda como sua pátria futebolística. Se querem uma prova, esperam o final da história.
A Holanda estreou na Copa contra a Dinamarca, e desde lá mostrou um futebol, não de espetáculo, mas de objetividade e de pragmatismo. Sabia fazer um placar e administrá-lo sem tomar sustos. Venceu assim a estréia por 2 a 0, do Japão por 1 a 0 e de Camarões por 2 a 1. Avançou para a fase seguinte sendo a única com 100% de aproveitamento juntamente com a Argentina. Nas oitavas-de-final enfrentou a surpreendente Eslováquia, que eliminou a Itália na primeira fase. Mais uma vez a Holanda venceu com objetividade. O placar final só foi 2 a 1, porque o juiz marcou um pênalti inexistente para a Eslováquia no último segundo de jogo. Nas quartas-de-final, Talita teria o jogo de sua vida.
A Holanda havia se classificado contra o país que Talita renegava. A Holanda enfrentaria ninguém menos que o Brasil. Quando isso se confirmou, Talita pôs-se a lamentar: “Não adianta, contra o Brasil tem sempre estranheza, vai dar Brasil e adeus à minha Holanda.” Apesar do sentimento, Talita pegou uma camisa da Holanda de 1974 que dei a ela e pediu que eu fosse à Central colocar o nome dela nas costas da camisa com o número 10, de Sneijder. Abaixo do número 10, pediu que escrevesse “HOLLAND”. Quando encontrei mais tarde, naquele dia, lhe entreguei a camisa e ela abriu um sorriso inimaginável, mas ainda assim, acreditava em vitória brasileira.
Sexta-feira, dia de Brasil x Holanda, pelas quartas-de-final da Copa do Mundo. Chegou em minha casa, Talita, envergando a camisa laranja da Holanda. Eu, uma camisa da Seleção Brasileira de 1970, com o 10 de Pelé costurado às costas. Era o dia, o grande dia. As previsões de Talita se confirmavam, quando Robinho fazia 1 a 0 para o Brasil logo no início do jogo e a Holanda mostrava-se totalmente perdida. No segundo tempo, porém, a Holanda virou o jogo com dois gols de Wesley Sneijder e despachou o Brasil para fora da Copa do Mundo. Os olhos de Talita brilhavam, o sorriso não cabia em seu rosto. Ela queria explodir de alegria, gritar para os quatro cantos do mundo que a sua Holanda havia vencido seu odiado Brasil.
A partir dali, Talita decretou que a Holanda seria sim campeã, e que ninguém mais segurava a Laranja Mecânica. Contra o Uruguai, nas semi-finais, Talita tinha um ídolo em campo: Sebástian “El Loco” Abreu era atacante do Botafogo, o que poderia fazer com que o coração de Talita ficasse dividido. Dividido? Coisa nenhuma! Talita torceu por sua Holanda de olhos fechados e viu sua nova pátria chegar às final da Copa ao vencer o surpreendente e raçudo Uruguai por 3 a 2. A final seria contra a Espanha.
Em meio a uma multidão no FIFA Fan Fest, nas areias de Copacabana, Talita torcida por sua Holanda, pelo primeiro título da Laranja Mecânica. Afinal, do confronto contra La Furia Española, sairia um campeão mundial inédito. O jogo foi bem tenso e a Holanda abriu mão do futebol pragmático para distribuir pontapés e coices durante o jogo. O futebol objetivo da Holanda estava em colapso devido à forte marcação espanhola, que jogava nos contra-ataques. Talita ia à loucura com a quantidade de cartões que o árbitro inglês impunha à Holanda e com os erros de passe que o meio campo holandês executava. Talita havia dito, durante o jogo, que sentiu que daria Espanha assim que pusera a camisa da Holanda para torcer.
Em um contra-ataque rápido, após um lance duvidoso em que Iniesta estaria em impedimento, o jogo que parecia se encaminhar para os pênaltis, tomou um final triste para Talita. Iniesta recebeu novamente, dessa vez em posição legal e chutou cruzado, vencendo o goleiro Stekelenburg. A Espanha fazia 1 a 0 faltando 2 minutos para o término do jogo corrido. Os olhos de Talita marejaram de imediato, dando assim a sua prova de que havia se tornado holandesa. A Holanda ainda tentou uma ou duas vezes, mas o gol de empate não saiu. Os olhos de Talita fraquejaram e não conseguiram segurar as lágrimas de dor. Seu coração holandês, fora espremido de tristeza e o sumo que saía-lhe pelos olhos era a conseqüência.
Mais uma Copa do Mundo se encerra. Para Talita, o gostinho de ter chegado tão perto e ter perdido causou-lhe dor, sem qualquer dúvida, mas deixou nela esta marca, este sentimento holandês. A jovem holandesa, a nova filha de Wilhelmus van Nassauve, a moça do coração cor-de-laranja, aguarda agora ansiosamente a Copa de 2014 a ser realizada aqui no Brasil, e a oportunidade de ver a sua laranja mecânica de perto.
Abaixo, um pouco da retratação do que sentiu Talita, a mais nova holandesa no mundo:
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